EA – Você é referência no ecossistema de Inovação brasileiro, onde tudo começou?
Henry
Assim como muitas pessoas que estão lendo essa entrevista: Tudo começou em uma família que não mediu esforços para propiciar uma boa educação aos filhos e, sobretudo, muito amor, valores e princípios (entre erros e acertos). Já a missão de conectar ambientes e atores do ecossistema de inovação como uma forma de transformar o mundo em um lugar melhor.

Essa missão começou a se tornar um pouco mais clara há cerca de dez anos, quando comecei a viajar pelo Brasil afora compartilhando conhecimentos sobre patentes e inteligência tecnológica (e pude ver de perto a diversidade, a riqueza e também as desigualdades do nosso país) e, nessa mesma época, me tornei mentor do programa InovAtiva (e conheci muita gente boa, em diversas áreas, com distintos perfis).

Agora, essa missão ficou clara mesmo durante a pandemia de covid-19 em que ficou escancarada a falta de conexão e de coordenação entre os ambientes e atores. E, infelizmente, isso não vale só para inovação, mas para tudo.

EA – Como analisa a importância do seu papel nesse ecossistema?
Henry
Em um país como o Brasil, com dimensão e potencial continental, mas com uma dinâmica ainda quase feudal, penso que pessoas que atuam na conexão de ambientes e atores sejam importantes para derrubar muros e construir pontes, para unir iniciativas com redução de desperdício e com ganho de escala, para reunir lideranças que possam colaborar, cocriar e por aí vai. Nesse ponto, vale comentar que temos cerca de 40 “Estratégias Nacionais” no Brasil, sendo que o grau de conexão entre elas é muito baixo e a cada 4 anos muitas são reformuladas ou abandonadas.

EA – Situe o Brasil no ranking global de Inovação?
Henry
O Brasil ficou na posição de número 49, entre as 132 economias ranqueadas no Global Innovation Index 2023, sendo o primeiro colocado na América Latina e Caribe, ultrapassando o Chile. Vale comentar que algumas das métricas utilizadas nesses rankings são um tanto questionáveis. Por sua vez, refletem bem uma coisa que intuitivamente sabemos: há muito, mas muito espaço mesmo para melhoria.

EA – Qual a melhor qualificação do Brasil em Inovação de forma tangível? Há protagonismo?
Henry
É difícil falar sobre “a melhor” qualificação ou protagonismo, mas podemos destacar o universo agro como uma das áreas de destaque no Brasil, por conta não só de importantes contribuições da Embrapa e diversos Institutos de Pesquisa e Universidades, mas, também, de políticas de financiamento, infraestrutura, entre outras. Outro exemplo tangível é o setor aeroespacial, com destaque à Embraer, em conexão com o ITA e muitas outras Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs).

Temos dezenas de outros exemplos em segmentos como medicina, odontologia, papel e celulose e tantos outros segmentos. Em praticamente todos os casos, a conexão e atuação conjunta entre empresas, ICTs e governo pode ser colocada em posição de destaque, sem deixar de falar em outros atores.

EA – Quando falamos em Inovação, quais os organismos-atores? Explica pra gente como opera esse ecossistema?
Henry
Grandes Corporações, Pequenas e Médias Empresas, Academia, Startups, Sociedade Civil, Governo, Organizações de Conexão e Suporte, Financiadores, Reguladores e tantos outros atores compõem o ecossistema de inovação. Cada segmento tem uma dinâmica própria e mesmo dentro de um mesmo segmento, o peso de cada ator será diferente a depender do modelo de negócio e dos tipos de inovação envolvidos.

São tantas variáveis que aqui a melhor resposta seja: temos uma multiplicidade de atores, interconectados e interdependentes.

Assim como em um ecossistema biológico, diversidade e equilíbrio são fundamentais. Apenas para ilustrar, basta pensarmos em como inovação no varejo e e-commerce pode ser diferente de inovação no turismo e economia criativa…e como essas podem ser diferentes de inovação no setor elétrico ou automotivo.

EA – O Brasil é um país criativo, muito disso, relacionado ao contexto de sobrevivência empresarial. Uma realidade que ficou distante nesta era digital? Ou ainda é assim
Henry
Criatividade, empreendedorismo, capacidade de improvisação e resiliência são algumas características marcantes em nosso país. Por outro lado, também são muito comuns por aqui a falta de planejamento, a falta de visão global, a falta de trabalho colaborativo (aqui, talvez valha uma exceção para o notável cooperativismo no universo agro) entre outras faltas mais.

Interessante comentar que muitas ótimas ideias ou negócios acabam não prosperando pela desconexão, falta de escala ou pelo desconhecimento de princípios básicos de propriedade intelectual.

Não raramente brasileiros desperdiçam criatividade reinventando a roda (por não estudarem o que já existe). Nos raros casos em que criam uma coisa realmente nova, acabam não sabendo como proteger e levar ao mercado. Essa realidade segue na era digital.

EA – O que é de fato relevância em Inovação empresarial hoje?
Henry
Como comentado anteriormente, cada segmento e cada modelo de negócio tem sua dinâmica própria. Independente do tipo de inovação um ponto relevante é o atendimento de um mercado relevante. Essa relevância pode ser medida pelo tamanho do mercado, pelo público impactado, pela importância da solução, etc. Em um país com a diversidade e o potencial do Brasil, um tipo de inovação que ainda pode ser melhor explorado é o de inovação em redes ou consórcios, com a agregação e consolidação de grupos empresariais ou com a formação de cooperativas.

EA – E qual o papel, a relevância das Startups neste contexto?
Henry
Para falarmos do papel e relevância de Startups, vale primeiro definirmos o que são Startups. Embora haja várias formas de definir o que são Startups, algumas características são comumente citadas. Entre elas: (i) ser uma empresa nova, (ii) em busca de um modelo de negócios escalável e repetível, (iii) em torno de uma solução inovadora, com impacto na sociedade.

Há ainda quem inclua uma característica adicional: (iv) em um ambiente de risco e incerteza, sendo que o risco e a incerteza vêm justamente do fato do impacto da solução ainda não ter sido comprovado.

Não por acaso, Startups são prevalentes no universo digital ou de biotecnologia, em que os custos de escalonamento são relativamente baixos. Interessante comentar que, salvo exceções, o destino de startups acaba sendo sua aquisição por grupos empresariais maiores. Em termos de papel e relevância, podemos citar: diversidade, disrupção e diluição de risco.

EA – Você é criador de muitas patentes, qual sua aposta nelas? Alguma em especial?
Henry
Entre invenções minhas que foram objeto de patentes concedidas, uma que merece destaque são as Clever Caps, que são tampas de embalagens que podem ser reutilizadas como blocos de montar e que são compatíveis com blocos de montar comerciais, como, por exemplo os da marca Lego.

Foi uma criação com múltiplos prêmios no Brasil e no exterior e que chegou à semifinal da votação popular no Design Museum de Londres, entre os Designs of the Year de 2014. As Clever Caps chegaram a ser lançadas no Brasil, mas não tiveram sucesso comercial.

Ainda restam alguns anos de proteção por patentes em vários países e torço muito para que o Claudio Patrick Vollers consiga fazer o produto deslanchar. Agora entre as invenções/criações com as quais contribuí, mas não são patenteáveis, aposto muito no futuro de redes de colaboração. Especialmente o Tech Brazil Advocates, que pode ser objeto de uma conversa à parte.

EA – Um movimento recente em empresas players é a criação de diretorias de Inovação, elas precisam ter funcionalidade, não?
Henry
Tem muitas empresas que criam áreas ou programas de Inovação por modismo ou como ferramentas de marketing. No passado, era comum vermos isso com Qualidade. Agora, além de Inovação, tem uma onda de ESG. Entre as coisas ruins do modismo, vem um efeito colateral positivo: com o tempo, fala-se menos e faz-se mais.

EA – Inovar requer recursos, no Brasil temos eles? Onde estão e como ter acesso a fomentos?
Henry
Temos sim recursos para inovação no Brasil. Certamente poderíamos ter mais, mas recursos temos. Para quem estiver buscando fomento financeiro e técnico, vale estudar as opções organizadas pela MEI, CNI e Sebrae no MEI Tools: https://meitools.com.br/

EA – Se pensarmos em Governo, qual a principal pauta dele hoje em Inovação?
Henry
Entre as principais pautas do Governo Federal em Inovação podemos citar a neoindustrização (Nova Indústria Brasil), o recém lançado Plano Brasileiro de Inteligência Artificial e a formulação da Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia & Inovação. Vale aqui comentar uma vez mais que temos dezenas de “Estratégias Nacionais” e todas elas envolvem inovação.

Uma pauta que talvez precise ser abordada é a integração e conexão das dezenas de “Estratégias” e as centenas de “Políticas”. Outra pauta importante é o acesso e a integração entre as centenas de bases de dados públicas.

EA – Você é formado em Farmácia, atuou no setor, e de lá pra cá, é um entusiasta de mercados de transformações, o que te atrai nesse ecossistema?
Henry
Escolhi o curso de Farmácia e Bioquímica, movido pelo sonho de criar remédios inovadores para benefício da humanidade. Com o tempo, me especializei em propriedade intelectual e na prospecção e uso de informações tecnológicas. Essas últimas áreas se aplicam a qualquer ambiente de inovação e acabou servindo como ponte para contatos com empresas dos mais diversos segmentos.

Hoje, atuo direta ou indiretamente com empresas do setor petroquímico, aeroespacial, siderúrgico, energético, químico, alimentício e tantos outros. Além de centenas de Universidades e ICTs em todo o país. Se considerarmos que informações, conhecimento e conexões são remédios, acaba sendo o sonho de juventude se concretizando.

EA – De quais nichos virá a inovação que impactará o Brasil nos próximos anos, qual sua aposta?
Henry
Alguns setores em que eu apostaria são: Bioeconomia, Saúde e Energia.

EA – Por que as empresas precisam saber utilizar ferramentas, integrar inteligência tecnológica, independentemente do seu tamanho?
Henry Resumidamente: Para não trabalharem no escuro, para não gastarem tempo e dinheiro reinventando a roda e para minimizarem o risco de se verem impedidas de colocarem seus produtos e serviços no mercado, por conta, por exemplo, de patentes de terceiros. Adicionalmente, por que é relativamente barato e fácil fazer a lição de casa para conhecerem o ambiente competitivo, os grandes players, possíveis parceiros, etc. Agora, verdade seja dita, a importância varia muito de segmento para segmento.

EA – Percebe que nos conteúdos programáticos de cursos no geral, falta fundamentos sobre o que seja Inovação?
Henry Penso que mais que conteúdos programáticos sobre inovação e mais que fundamentos sobe o que é inovação, falta levar experiência prática em inovação para os ambientes de aprendizado. Para isso é importante ter profissionais “mão na massa” que tenham levado produtos, serviços e práticas inovadoras para o mercado ou para as organizações em que atuam. Em resumo, menos teoria e mais prática.

EA – Este teu senso bacana de comunidade, coletividade, de onde veio?
Henry
Veio da sorte de ter me despertado para o fato que as coisas mais valiosas da vida são retorno do que compartilhamos.

HENRY SUZUKI 3 - ENTREVISTA | Henry Suzuki

Henry Suzuki é sócio-fundador e CEO da Axonal Consultoria Tecnológica. É especialista em patentes e inteligência tecnológica. Atua na construção de projetos e redes de inovação, com foco na criação, proteção e monetização de ativos intelectuais. É um influenciador e participante ativo em redes e comunidades como Tech Brazil Advocates, Mentores do Brasil e Open Innovation BR.

https://www.linkedin.com/in/henry-suzuki/

 

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