Capitalismo do sono | Felipe Gruetzmacher 

 

O objetivo deste artigo é apresentar uma sinopse, uma visão geral de um conto sci-fi (ficção científica). O texto se encaixa nos moldes da EA Magazine por apresentar uma versão crítica sobre o trabalho humano. Apresento reflexões que creio, bastante ácidas, a partir da sinopse. 

Sinopse

No futuro, o ser humano não tem mais a necessidade de dormir ou descansar, graças a uma pílula criada por cientistas. Agora, esses estudiosos receberam uma proposta de trabalhar para corporações com o intuito de utilizar o medicamento para transformar pessoas comuns em colaboradores incansáveis. A questão traz muita polêmica por tratar pessoas como simples máquinas integradas ao sistema capitalista. 

Vale a pena substituir a natureza humana pela promessa de fabulosos lucros corporativos?

Reflexões

  1. Poder do dinheiro. Este, penetra até mesmo nos espaços íntimos das pessoas. Antes, por exemplo, o marketing se especializou em comercializar roupas prometendo embelezar as pessoas numa clara tentativa de mudar percepções e gostos pessoais. Agora, o último refúgio da intimidade humana foi invadido pela economia. Nosso sono foi transformado em momentos de labuta. Essa sinopse é uma poderosa metáfora para a mercantilização da vida privada.
  2. Mesmo a medicina. Profissão cujo propósito é atender vidas humanas, foi transformado numa técnica à serviço da maquinaria capitalista e do trabalho desumanizante. O progresso, tecnologia, mercado e dinheiro devem estar à serviço do desenvolvimento humano. O tempo dedicado ao trabalho precisa ser um tempo dedicado à evolução das habilidades humanas e genuinamente enriquecedor. É uma visão quantitativa: impulsionar as qualidades humanas tais como criatividade, inteligência e colaboração. Caso contrário, o ser humano só será mais uma ferramenta do dinheiro.
  3. Não dormir mais. Não é mais uma necessidade fisiológica, a humanidade terá muito mais tempo para se dedicar ao trabalho. Logo, existe o risco de algumas pessoas não encontrarem um sentido para viver. Até porque uma vida somente dedicada ao trabalho é uma vida miserável, escrava.
  4. Ameaças a humanidade. Sempre há a preocupação de crises energéticas, porque a geração de energia precisará ser ampliada para iluminar as noites continuamente. Empresas até podem adotar princípios ESG e gerar energia de forma sustentável. Mesmo assim, a ameaça das crises energéticas persiste, pois o consumo excessivo supera os benefícios ambientais trazidos com a adoção do ESG e de energias alternativas.
  5. Mais pessoas empreendendo. Por causa de um marketing que incute a ideia de que dormir é uma falha moral. Assim, com maior número de empreendimentos, haverá maior número de quebras e falências empresariais. Afinal, a verdade é dura e precisa ser dita: nem todos têm talento, condições ou estão num contexto favorável para iniciar um projeto inovador. Ainda mais quando acontece algum tipo de recessão econômica! Teremos um exército de zumbis de gente eternamente acordada, desempregada, falida e entristecida.
  6. Ritmo de trabalho exagerado. Não duvido que esse ritmo possa trazer maior progresso tecnológico e inovações científicas. Agora, esses lucros fabulosos terão poucos donos, enquanto a desigualdade social se amplia. Além disso, esse cenário distópico vai polemizar ainda mais as questões éticas envolvendo o uso da ciência.
  7. Forma de trabalhar. Não importa se uma corporação adota trabalho presencial, remoto ou híbrido: como as pessoas sempre estarão trabalhando arduamente, até mesmo a mais divertida das tarefas será transformada numa chatice.
  8. Funcionamento do cérebro será afetado. Talvez, seremos até mais inteligentes, pois nosso lado lógico e racional terá maior conexão com a imaginação, a criatividade e a habilidade de fazer associações livres. Se perdermos a capacidade de sonhar, nossas ideias loucas vão se manifestar enquanto estivermos acordados, o que potencializa nossa capacidade de ideação e criação mental. A polêmica nisso é que estamos não só vendendo nossa força de trabalho para as empresas, mas, também, nossa intimidade, nossa subjetividade e essência. Afinal, os sonhos pertencem ao mundo privado, num recanto tão íntimo que nem a consciência humana tem acesso total. Nossa personalidade virou um produto!
  9. Empregos X habilidades intelectuais. Há potencial e eles serão criados. Mas como os gestores de talentos e os algoritmos que selecionam candidatos vão se comportar num mundo onde o mais importante é a imaginação e a capacidade de sonhar acordado? Como vão mensurar o desempenho desse tipo de colaborador? Qual é a melhor forma de atrair esse tipo de talento?

Sinopse fantasiosa?

Apesar dessa sinopse ser bem fantasiosa e exigir muita suspensão de crenças, a narrativa serve como metáfora para explorar alguns pontos que descrevo aqui. 

  • Com tanta tecnologia e progresso, ainda não conseguimos driblar crises financeiras e o desemprego.
  • Estamos cada vez mais distantes da nossa biologia e das nossas reais necessidades. Nossa economia só atende ao supérfluo e comercializa futilidades. O consumo e o trabalho excessivo se tornaram elementos quase sagrados no nosso cotidiano.
  • Um problema filosófico é colocado: existe sentido e propósito fora do trabalho.
  • Nossa obsessão pela produtividade está destruindo nosso meio ambiente global.
  • Estejamos atentos: o marketing sempre estará querendo incutir novas ideias sobre o que é sucesso financeiro, estimulando nosso vício no trabalho e estilo de vida consumista.
  • Por mais que reconheça a importância do marketing dos negócios com impacto social, é inegável condenar o outro tipo de marketing, cujo único objetivo é estimular o estilo de vida consumista. 

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Conto 2: Qual é a empresa dos seus sonhos? Acesse aqui.

 

felipe Easy Resize.com - Capitalismo do sono, um conto sci-fi

Felipe Emilio Gruetzmacher é formado em gestão ambiental, educação ambiental e se especializou em copywriter através de muitos cursos online, muita prática e dedicação. Autor na Comunidade EA é um dos mais lidos na plataforma. Tenta decifrar os enigmas do trabalho humano, até porque essas questões podem mudar os rumos da sociedade humana e acelerar a marcha da história rumo à Utopia.

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