O mundo dos desempregados | Felipe Gruetzmacher
A economia global é sacudida por uma crise violentíssima. Muitas startups e grandes empresas iniciam demissões em massa. Nesse tempo, surge uma nova moda na gestão dos talentos: organizações contratam palestrantes motivacionais para consolar e reativar o ânimo de times empresariais que temem a perda de emprego. Esses especialistas em mexer com os sentimentos das pessoas sabem como esconder esse duro contexto com palavras adocicadas e muitos argumentos rasos. Não há nenhuma estratégia para apoiar os colaboradores demitidos ou humanizar o processo de desligamento das corporações.
Uma espécie de distopia é mascarar a realidade com palavras piegas, clichês e muito sentimentalismo barato.
Agora, se não existem respostas prontas, como se sente um desempregado?
Qual é a melhor forma de entender as percepções e o mundo deles?
Será que a sociologia pode alcançar esses objetivos e inovar a área de RH?
Vamos examinar os conceitos trazidos com a obra “Reagregando o social – Uma introdução à teoria do Ator-rede” de Bruno Latour.
Insights:
- O livro traz a abordagem da sociologia das associações ou sociologia crítica. Nessa abordagem não é possível separar o lado social dos demais fenômenos.
Por exemplo: Pessoas de quarentena por conta de um vírus não podem visitar amigos e parentes. É o risco da contaminação que evita a socialização. A biologia está conectada com a sociologia.
Noutra situação, temos organizações empresariais que estão em redes de negócios e numa cultura corporativa comum. Tudo são associações e dissociações.
- Portanto, a sociologia crítica analisa as relações sociais: parte da teoria ator-rede para entender como acontecem associações e socializações.
- Uma boa aplicação da teoria ator-rede é a expansão da inovação, ciência e tecnologia, pois são elementos que exigem pessoas lidando umas com as outras.
- O objetivo dessa abordagem sociológica é rastrear conexões e interações sociais para interpretar o todo social. O micro movimenta o macro.
- Os atores dos grupos sociais são as vozes do grupo e dão significados às ações do grupo.
Por exemplo: Reivindicações de mulheres formam um grupo de feministas. Essas reivindicações são as vozes e as atitudes do grupo que mantém a coesão. Afinal, sem ação e identidade própria, os grupos se desfazem.
- Existem intermediários que transportam significados e mediadores que transformam significados. Exemplos:
Um computador pode ser considerado um intermediário: recebe e envia informações (significados) sem alterá-los.
Já uma conversa de bar é uma forma de mediação: pessoas ouvem opiniões de outras e interpretam do jeito delas.
Mediadores e intermediários são os responsáveis por dar significados às ações do grupo, permitindo comunicação e associação (formação de grupos).
Logo, a tarefa da sociologia é interpretar esses significados, atitudes e ações.
Além disso, é preciso entender como as ações transformam os atores.
Por exemplo: a atitude de estudar, conquistar um diploma universitário e ascender socialmente faz com que um indivíduo acesse novos grupos sociais.
Figuração é um elemento que faz parte da ação do ator.
Exemplo: A cultura monogâmica é uma figuração: está envolvida na prática de estabelecer famílias monogâmicas. Elementos não humanos e atores interagem.
Aplicações na área do RH:
- Os desempregados constituem um grupo, uma associação de indivíduos “unidos” pelo mesmo problema: a falta de um emprego. Logo, a área de RH e HR Techs podem perseguir o propósito de atingir uma enorme fatia populacional facilitando o acesso ao emprego. O desemprego precisa ser analisado como um problema público comum e requer atenção e soluções coletivas.
- A teoria do ator-rede é muito útil para entender como relações sociais como demissões, admissões e interação entre pessoas e áreas de RH podem fornecer insights para HR Techs. É o progresso tecnológico e inovação.
- Os desempregados constituem um grupo com uma visão de mundo própria. Eles elaboram os próprios significados.
Por exemplo: como um pai de família se sente estando sem poder trabalhar?
Esse sentimento tem todo um significado. Assim, startups de outros nichos podem analisar esses sentimentos, cotidiano e ações dos desempregados para aliar esforços com HR Techs, GovTechs e Fintechs apoiando o grupo nos momentos difíceis. Todos esses modelos inovadores podem desburocratizar o acesso a benefícios governamentais, direitos sociais e garantir a inclusão financeira com menor custo e maior praticidade.
Todos esses ganhos facilitam a vida das pessoas desempregadas!
Um verdadeiro ecossistema consiste em beneficiar uma mesma persona através de diversas soluções, porque isso reforça conexões entre startups! Para tanto, a sociologia acadêmica assume um papel protagonista na hora de analisar relações entre os diversos tipos de tecnologia, pessoas e negócios.
É a teoria reforçando a prática e vice-versa. Eis uma excelente oportunidade de alinhar o ensino superior, as ciências sociais e o progresso tecnológico!
- Com HR Techs e uma gestão de talentos eficiente, o micro pode movimentar o macro e ampliar o impacto social: cada pessoa que deixa o desemprego graças à tecnologia é uma validação. Com consistência e foco no cliente, Startups podem alcançar resultados fabulosos começando aos poucos.
- Como os desempregados veem as HR Techs? A tecnologia é um intermediário para conectar talento e vaga. Na abordagem sociológica, o intermediário só transporta significados: é o caso da tecnologia HR Tech que só recebe e envia dados.
- Como melhorar a performance dos algoritmos considerando que eles não percebem a incrível variedade de habilidades humanas? Uma boa conversa com as personas (empresas e capital humano) pode resolver esse dilema. Nesse caso, a conversa é um mediador: uma boa troca de ideias entre empreendedor e usuário pode aprimorar a solução mercadológica.
- Um outro importante insight é descobrir o tempo médio que um determinado grupo leva para conseguir emprego e o porquê.
Por exemplo: em geral, qual é o tempo que jovens saídos do ensino superior levam para conquistar um emprego? Por quê? Quais são as razões? A partir disso, a proposta de valor pode ser ainda mais customizada.
Com a oferta de uma tecnologia que faz a diferença na vida dos desempregados, ela acaba virando uma figuração, um elemento que faz parte da ação do ator.
Conquistar o emprego através de um app é uma ação, enquanto o app é o elemento não humano, a figuração.
Assim, podemos entender como a tecnologia molda percepções e ações, transformando uma questão individual, o desemprego, num problema público que merece uma resposta coletiva.
Felipe Emilio Gruetzmacher é formado em gestão ambiental, educação ambiental e se especializou em copywriter através de muitos cursos online, muita prática e dedicação. Autor na Comunidade EA é um dos mais lidos na plataforma. Tenta decifrar os enigmas do trabalho humano, até porque essas questões podem mudar os rumos da sociedade humana e acelerar a marcha da história rumo à Utopia.
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