Por João Casarri Neto
Panorama e definições: a idade como barreira invisível
O etarismo no trabalho é o preconceito — explícito ou velado — contra pessoas em razão da idade. Ele se estrutura em três pilares que se retroalimentam: estereótipos (como pensamos), preconceito (como sentimos) e discriminação (como agimos). No ambiente corporativo, essa prática se manifesta na preferência por perfis mais jovens em processos seletivos, na redução de oportunidades de desenvolvimento para profissionais maduros e na desvalorização da experiência adquirida ao longo da carreira — mesmo diante de evidências de que equipes multigeracionais impulsionam a inovação, a troca de conhecimento e resultados mais sólidos.
Trata-se de um dos vieses mais persistentes e silenciosos no mercado de trabalho. Pode aparecer em anúncios “modernos” que priorizam juventude, na ausência de planos de promoção para profissionais mais velhos ou em treinamentos voltados apenas para quem está começando.
Ao contrário do que muitos acreditam, não é apenas uma questão individual, restrita a histórias isoladas.
O etarismo é um problema estrutural, cultural e econômico, que mina carreiras, empobrece a diversidade de pensamento nas organizações e enfraquece sua competitividade.
Ao excluir ou subaproveitar talentos experientes, empresas desperdiçam um capital humano estratégico, comprometendo também o desenvolvimento sustentável das sociedades.
O tamanho do problema
- No Brasil: pesquisas mostram que 41% dos profissionais relatam ter sofrido algum tipo de discriminação etária. As ações trabalhistas com alegações de etarismo saltaram de apenas 3 em 2018 para mais de 400 em 2023, evidenciando um crescimento de mais de 13.000%. (*)
- Mulheres 50+: enfrentam um duplo desafio. Além da barreira etária, lidam com o machismo e desigualdades de gênero, o que torna ainda mais difícil a permanência e progressão na carreira. (**)
- Descompasso demográfico: enquanto a população brasileira envelhece, a presença de profissionais com 50 anos ou mais nas empresas não acompanha essa realidade — perdendo-se assim memória organizacional e diversidade cognitiva. (***)
Impactos para pessoas e negócios
- Para o profissional: desemprego ou subemprego de longa duração, perda de renda e impacto na identidade pessoal.
- Para empresas: rotatividade cara, menor capacidade de inovação e risco jurídico por práticas discriminatórias.
- Para o mercado: exclusão de talentos que poderiam contribuir para a resolução de problemas complexos e para a mentoria de novas gerações.
Equipes multigeracionais, quando bem geridas, são consistentemente associadas a mais inovação, melhor desempenho e maior resiliência organizacional.
O que a lei diz
No Brasil, a CLT e a Constituição Federal garantem a igualdade de oportunidades e proíbem a discriminação por idade. A Lei 9.029/1995 veda práticas discriminatórias na contratação e manutenção do emprego. Além disso, como citamos acima, a Justiça do Trabalho tem acolhido cada vez mais ações e indenizações relacionadas ao etarismo, o que pressiona empresas a revisarem suas políticas internas.
Boas práticas corporativas
Para virar o jogo, organizações que levam a diversidade etária a sério investem em:
- Recrutamento livre de vieses: eliminando exigências que sinalizam idade, treinando recrutadores e ampliando o funil de talentos.
- Metas e indicadores: monitorando a presença e progressão de profissionais por faixa etária.
- Formação contínua para 50+: programas de atualização e reconversão de carreira.
- Equipes intergeracionais: composição intencional e estímulo à troca estruturada de conhecimentos.
- Mentoria reversa: compartilhamento mútuo de habilidades entre gerações.
- Carreiras flexíveis: criação de trilhas que valorizem a experiência técnica e de gestão.
- Ergonomia e bem-estar: ajustes físicos e flexibilização de jornada para maior equilíbrio.
- Responsabilidade da alta gestão: inclusão de metas de diversidade etária na remuneração variável de lideranças.
- Cultura inclusiva: comunicação interna e externa livre de preconceito e intolerância zero a micro agressões.
Ações governamentais e políticas públicas
Alguns exemplos já adotados no Brasil e no exterior:
- Leis antidiscriminação: Estados Unidos, União Europeia, Reino Unido e Brasil têm legislações específicas sobre idade no trabalho.
- Fiscalização ativa: criação de canais de denúncia e atuação de órgãos públicos.
- Requalificação e transição: programas de atualização de competências para profissionais acima de 45/50 anos.
- Incentivos à contratação: subsídios e redução de encargos para empresas que empregam trabalhadores mais velhos.
- Aposentadoria flexível: permitindo o prolongamento voluntário e equilibrado da carreira.
- Campanhas públicas: combate à cultura do “envelhecimento inútil” e valorização da longevidade produtiva.
Como o profissional pode se preparar
Mesmo diante de barreiras, existem estratégias que aumentam a empregabilidade:
- Reposicionamento de valor: traduzir experiências em resultados atuais e relevantes para o mercado.
- Atualização direcionada: concentrar esforços em competências técnicas e comportamentais mais demandadas.
- Narrativa de adaptabilidade: mostrar versatilidade e abertura para aprender.
- Busca multicanal: ampliar redes e buscar empresas com políticas inclusivas para todas as idades.
- Mentoria reversa: oferecer troca de conhecimentos de forma proativa.
- Flexibilidade de formatos: negociar contratos por projeto ou consultorias.
Oportunidade histórica
A discussão sobre etarismo não é apenas uma demanda ética. É também uma resposta estratégica às mudanças demográficas que já estão batendo à porta das empresas. No Brasil, em poucos anos, a força de trabalho será majoritariamente formada por pessoas acima dos 40 anos. Ignorar essa realidade é renunciar à competitividade.
Mais do que combater o preconceito, é hora de redesenhar o futuro do trabalho para que cada etapa da vida profissional seja respeitada, valorizada e aproveitada em seu máximo potencial.
Fontes:
- (**) https://fdr.com.br/2025/08/14/entenda-o-desafio-do-etarismo-no-mercado-de-trabalho-para-mulheres-50/
João Casarri Neto é economista, consultor de RH/TI, analista comportamental DISC, coach, mentor, treinador de líderes, e Practitioner PNL. Autor do livro “Os 5 Princípios da Resiliência”, é também criador do programa “Sou Líder, e Agora?” para ajudar líderes em início de carreira. É Embaixador de Inovação e Tecnologia da Associação Brasileira dos Profissionais de RH (HUBRH+ABPRH). Colunista EA “Geração 50+”.
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