Por Luciel Henrique de Oliveira
A escolha do Brasil para sediar a COP30 em Belém, no Pará, em 2025, é muito mais do que um evento diplomático. É um divisor de águas estratégico para toda a economia nacional e um sinal claro para o setor empresarial: a era da sustentabilidade como um projeto periférico acabou.
Agora, ela é central para a competitividade, a resiliência e a própria licença para operar.
Enquanto o governo se mobiliza com propostas ambiciosas, como a integração global dos mercados de carbono, uma iniciativa fundamental para destravar bilhões em financiamento climático, as empresas brasileiras são chamadas a uma jornada de transformação igualmente ousada. Os holofotes do mundo estarão sobre nós, e isso representa tanto um risco reputacional imenso quanto a oportunidade de negócio do século.
Para além do greenwashing: a transparência como moeda de troca
Autores e pesquisadores do tema alertam que o greenwashing se tornará insustentável. Investidores globais, como a BlackRock, já utilizam sofisticadas análises de satélite e de dados para verificar alegações ambientais. Uma declaração vaga sobre “compromisso com a sustentabilidade” não engana mais.
O que será demandado é a transparência radical, lastreada em padrões globais. Os padrões IFRS S1 e S2, que estão se tornando a linguagem universal do relato ESG, serão a nova gramática dos negócios. Empresas como a Vale e a JBS, historicamente sob escrutínio, já investem pesadamente em sistemas de rastreabilidade e relatórios detalhados. Não se trata mais de marketing, mas de gerenciamento de risco e acesso a capital. A Ambev, por exemplo, tem metas públicas claras de redução hídrica e de carbono em toda sua cadeia, atrelando a remuneração de seus executivos a esses resultados. Essa é a materialização concreta do compromisso.
A revolução da cadeia de valor: nenhuma empresa é uma ilha
Nenhuma grande corporação poderá alegar sustentabilidade se sua cadeia de fornecedores for um ponto cego. O desmatamento ilegal, as violações de direitos trabalhistas e a baixa eficiência ambiental de um pequeno fornecedor se tornarão passivos diretos da marca principal.
A solução passa pela tecnologia e pela colaboração. A Natura é um caso emblemático, com seu modelo de negócios que integra comunidades da floresta em uma cadeia de valor de impacto positivo. Setores como o agropecuário verão a adoção de plataformas como o “Boi na Linha”, do Instituto Centro de Vida (ICV), que permite o monitoramento de fornecedores indiretos de gado, uma das fronteiras mais críticas para o desmatamento. A empresa que não conhece e não gerencia sua cadeia de valor integral estará, inevitavelmente, fora do jogo.
O mercado de carbono: uma oportunidade concreta e iminente
A proposta brasileira na COP30 de criar um mercado global de carbono interoperável, conforme detalhado no site oficial da conferência, não é uma discussão acadêmica.
É a fundação de um novo ativo financeiro.
O Artigo 6 do Acordo de Paris está criando as regras para que países e empresas negociem créditos de carbono.
Isso abre um leque de oportunidades para setores além do florestal. Empresas de energia renovável, como a Engie Brasil, já geram créditos com seus parques eólicos e solares. A Raízen, produtora de etanol de cana-de-açúcar, transforma seu processo em biocombustível de baixa carbono em um gerador de créditos. Empresas de logística que investirem em frota elétrica ou a biometano poderão, no futuro, monetizar suas reduções de emissão. O carbono deixará de ser apenas um custo operacional (via taxação) para se tornar uma receita.
Desdobramentos e aplicações práticas:
- Setor Financeiro: Bancos e seguradoras desenvolverão produtos específicos para negócios verdes, com taxas de juros diferenciadas para operações lastreadas em ativos ambientais ou com comprovação de baixo risco climático.
- Tecnologia da Informação: Surgirá uma explosão de startups de green tech focadas em MRV (Medição, Relato e Verificação) de carbono, rastreabilidade de cadeias e análise de dados ESG.
- Varejo: Grandes varejistas como Magazine Luiza e Mercado Livre ampliarão seus programas de logística reversa e de rotulagem ambiental, pressionando fornecedores a adotarem padrões mais rigorosos para permanecerem em suas plataformas.
A COP30 é o prazo final. Os próximos anos são uma janela de oportunidade para as empresas internalizarem o ESG, transformando-o de um custo de Compliance no coração de sua estratégia de inovação e geração de valor de longo prazo. A hora de agir é agora.
Para refletir:
- O que a sua empresa está fazendo hoje que, sob os holofotes globais da COP30, seria considerado greenwashing e traria um dano reputacional irreparável?
- Se o carbono da sua operação ou da sua cadeia de valor se tornasse um ativo financeiro negociável globalmente a partir de 2026, sua empresa estaria vendendo ou comprando créditos?
- Como você pode transformar os desafios socioambientais do Brasil (preservação florestal, biodiversidade, inclusão social) no core do seu modelo de negócios, criando vantagem competitiva única no mundo?
Para saber mais:
- FINK, Larry. Carta anual aos CEOs da BlackRock. 2023. Disponível em: https://www.blackrock.com/corporate/investor-relations/larry-fink-ceo-letter. Acesso em: 23 out. 2023.
- INTERNATIONAL SUSTAINABILITY STANDARDS BOARD (ISSB). IFRS S1: General Requirements for Disclosure of Sustainability-related Financial Information e IFRS S2: Climate-related Disclosures. IFRS Foundation, 2023.
- KAIMOVITZ, D.; MUNDO, N. O Desafio dos Fornecedores Indiretos na Pecuária Brasileira. Instituto Centro de Vida (ICV), 2021.
- PORTO, C.; MELLO, N. A Economia da COP30: Os Impactos da Conferência do Clima no Brasil. Revista Brasileira de Gestão e Inovação, v. 10, n. 2, 2024.
- WORLD ECONOMIC FORUM. The Global Risks Report 2023. 2023. Disponível em: https://www.weforum.org/reports/global-risks-report-2023/. Acesso em: 23 out. 2023.

Luciel Henrique de Oliveira é engenheiro Agrônomo e doutor em Administração (FGV), pós-doutorado em Inovação, dedicado à academia como professor e pesquisador desde 1990 (FACAMP; UNIFAE; PUC-MG). Com vasta experiência em Gestão de Operações e Logística, destacam-se seus estudos e pesquisas em temas como Inovação & IA, Agronegócios, Gestão de Serviços, Sustentabilidade/ESG, Economia Circular e Responsabilidade Social Empresarial. Comprometido com o impacto social, acredita no poder transformador da educação, na importância da colaboração em rede e no empreendedorismo para gerar mudanças positivas na sociedade mediante soluções inovadoras. Colunista EA “ESG & Vida Sustentável”.
www.linkedin.com/in/lucieloliveira
Fale com o editor:




















