Por Djairo Gonçalves

 

Alma, sinônimo da palavra grega psykhé e da palavra latina ânima é por vezes traduzida de forma simples e objetiva como “Mente” na Psicologia Analítica. Vale lembrar que neste espaço estamos falando da Alma em seu sentido psíquico, com foco nos estudos, nos experimentos psíquicos e na prática clínica realizados por Carl Gustav Jung e não no sentido religioso ou espiritual.

Ainda na Psicologia Analítica, a Alma é também chamada de Self ou Si-mesmo e engloba a totalidade dos processos psíquicos conscientes e inconscientes; pessoais e coletivos; racionais e irracionais dos seres humanos, ou seja, a Alma é como um grande teatro que cede seu palco para que se desenvolvam todos os espetáculos chamados processos psíquicos que envolvem cada indivíduo. No conceito de Jung nascemos indiferenciados do inconsciente coletivo onde é registrada a nossa história como espécie. Ao passo que vamos nos desenvolvendo, vamos acumulando energia psíquica por meio de nossas experiências sensoriais – nossas vivências.

E assim, vamos nos diferenciando e passamos a nos tornar quem somos.

É neste processo, influenciado pelo nosso histórico familiar e pelo ambiente em que vivemos que desenvolvemos nosso Inconsciente Pessoal, local de nossa psique onde são armazenados conhecimentos sobre nós mesmos e sobre nossa visão de mundo.

Onde se concentram toda sorte de informações objetivas, como os aprendizados conscientes, experiências reprimidas, traumas e as aprendizagens subliminares.

Sendo assim, é bem possível que nossa Alma tenha para cada um de nós seus próprios desígnios e, à medida que deixamos de vivê-los através de uma experiência humana simbólica, leve e harmônica para vivermos uma vida literal, rígida e adaptada ao meio ao qual pertencemos, nos afastando dos seus desígnios primordiais.

Somos levados de forma consciente ou inconsciente por um caminho de adoecimento físico e psíquico no qual podemos desenvolver as chamadas doenças psicossomáticas. E, ainda, sentir ou provocar em outros situações de dependências físicas ou emocionais, medos, abusos, inseguranças, fobias, preconceitos, agressividade, violência, distúrbios, entre outros sintomas facilmente percebidos nas sociedades que vivemos e, que frequentemente, se manifestam em nossas relações pessoais e no ambiente corporativo.

Vivemos tempos desafiadores

Estamos atravessando uma época em que muitos de nós acreditamos ser bem parecidos com aquela persona que expõe sua vida e sua intimidade nas redes sociais. No ambiente corporativo público ou privado, encontramos pessoas que podem se identificar literalmente com as atividades que realizam, com os títulos que possuem ou com os cargos descritos em seus crachás nas organizações às quais pertencem.

Não é incomum em entrevistas profissionais receber como resposta para uma pergunta de caráter pessoal um relato baseado exclusivamente no nome, cargo e experiência profissional do indivíduo.

É natural que a vida profissional exerça influência em nosso comportamento pessoal, entretanto, cabe ressaltar que é fundamental entender que as relações trabalhistas, apesar de estarem em constante processo de transformação, estão bem organizadas e estruturadas na maior parte de mundo civilizado.

Nisso, podemos observar um grande contingente de pessoas vivendo como se “pertencessem” não no sentido de se sentirem pertencentes e sim, mesmo de forma inconsciente, de serem propriedade de um grupo, uma entidade ou uma organização que lhes designa direta ou indiretamente, seu comportamento, seus direitos, suas responsabilidades, seus títulos. E ainda: sua forma de pensar e seus objetivos profissionais que muitas vezes se sobrepõem aos seus objetivos pessoais e, assim, esses indivíduos se fusionam com essa identidade adaptada, elaborada por terceiros.

E como nos lembra Jung, não encontram uma forma de representar o seu verdadeiro papel no drama divino da vida e, certamente, esta situação irá colaborar para um indivíduo longe dos desígnios primordiais de sua alma podendo estabelecer algum tipo de conflito com seu “verdadeiro eu”; com sua essência.

Conflitos são necessários para o desenvolvimento de nossa psique e para orientar nosso processo de individuação e, parafraseando James Hollis no livro “Os Pantanais da Alma”:

“… A alma não se desenvolve em campos verdes e ensolarados, mas sim no escuro dos pântanos…”.

Evidentemente é mais uma metáfora que nos convida ao difícil exercício consciente e consistente do autoconhecimento. De questionar nossos papéis e nosso comportamento com um objetivo único:

Saber exatamente quem somos, o saber um pouco mais a cada dia e, assim, exercer o nosso verdadeiro papel “no divino drama da vida” e oferecer em todos os nossos relacionamentos, o melhor de nós para nosso próprio crescimento e da sociedade ao nosso redor.

“Essas coisas entram tão fundo e não é de admirar que as pessoas fiquem neuróticas. A vida é racional demais, não há existência simbólica em que sou outra coisa, em que desempenho um papel, o meu papel, como ator no drama divino da vida”, Carl Gustav Jung

Fonte de referência: A Vida Simbólica – Obra Completa – Vol. 18/01

 

djairo e1726689094986 - A alma e o pântano

Djairo Gonçalves é psicoterapeuta com orientação Junguiana, e hipnoterapeuta. Atua apoiando pessoas em suas questões pessoais e profissionais. Realiza treinamentos, palestras, encontros e retiros com foco no aprimoramento de habilidades comportamentais (soft skills). Pós-graduado em Psicologia Analítica com MBA na Westminster University, Salt Lake City, USA. Pós-graduado em Marketing (ESPM-SP) com graduação em Administração de Empresas (Universidade Metodista). Mais de 25 anos trabalhando no segmento Financeiro e em consultorias estratégicas e de Recursos Humanos. Colunista EA “Espaço Caleidoscópio”.

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