Por Patrícia Milaré Bertão

 

Qual a importância do primeiro emprego para quem está ingressando no mercado de trabalho? A meu ver, total, irrestrita e cirúrgica.

Quando eu vou escrever sobre algum tema, eu procuro, além das minhas vivências, leitura sobre o assunto, muita conversa, ouvidos bem abertos e o processo de observação que completa o material. Tiro minhas impressões, expurgo o que não acredito ser interessante para a linha de raciocínio que vou seguir e a partir daí, escrevo.

Busquei conteúdo sobre o primeiro emprego e encontrei muitos textos sobre o assunto. Porém, todos eles falavam sobre como o jovem deve se comportar, se vestir, etc. Não encontrei nenhum que abordasse o tema sob o prisma da empresa, ou seja, como a empresa deve cuidar do jovem em sua primeira experiência de trabalho.

Historicamente, a sensação que tenho é que nos esquecemos que uma relação de trabalho tem que ser uma via de mão dupla e ambos, empregador e empregado, tem a mesma importância.

Não é apenas a empresa quem avalia o candidato, ele também deve avaliar a empresa e da mesma forma, essa relação do primeiro emprego, o cuidado tem que ser mútuo.

Por minhas vivências, lembro de uma passagem em meu primeiro trabalho em uma grande empresa. A sala do meu gerente era imponente com móveis de madeira de lei, impecavelmente organizada. Quando ele me chamava para passar alguma instrução, eu entrava e não percebia que fechava a porta atrás de mim e grudava as mãos atrás do corpo, na maçaneta. Permanecia assim até que a conversa terminasse e saia da sala. Ufa. Que alívio.

A maçaneta era a minha segurança sem que eu tivesse noção disso. Até que um dia meu chefe me chamou, eu entrei da mesma forma e para minha surpresa ele pediu que eu me sentasse na cadeira à sua frente.

Eu tremia e lembro até hoje da sensação. As mãos estavam molhadas e eu tinha certeza de que ia levar uma bronca, mas não tinha a mínima ideia por quê. Me sentei e mal conseguia olhar para ele. Ele, então, me fez uma pergunta que me deixou completamente desconcertada e sem saber o que responder. Ele me perguntou o que eu imaginava que ele fazia no banheiro.

Lembro de sentir o rosto esquentar e ficar rubro e me engasgar com as palavras. Ele percebeu e foi ao meu socorro e disse: “pois bem, eu faço o mesmo que você. Então, não precisa ter medo de mim. Pode entrar na minha sala de forma tranquila e sem receio”. Eu aprendi muito com essa lição e fui ganhando confiança dia a dia. Agradeço ter tido essa interferência positiva logo nos meus primeiros dias de trabalho.

A chegada ao primeiro emprego
Hoje, como será que o jovem está sendo recebido nas organizações? Acredito que a grande maioria das empresas não possui um programa de Onboarding pensado e desenhado para receber essa nova força de trabalho que chega “fresca, mas crua” sob muitos aspectos.

Quando o jovem chega em seu primeiro emprego, ele precisa absorver muita coisa. Como se comportar no ambiente de trabalho. A forma de se expressar. Como buscar informação sem ultrapassar limites e nem parecer acomodado. A relação hierárquica. Compartilhar o dia a dia com pessoas mais experientes e assim por diante. Lidar com frustrações. Com metas e entregas. Cultura da empresa e a organizacional. Saber dosar ímpeto e respeito aos processos e procedimentos.

Imaginem o turbilhão de informação. Absorver tudo e ainda fazer a transição de estudante para profissional.

Um período de muita resiliência e paciência deles e da empresa. Escolher a carreira a seguir com apenas 17/18 anos é complexo. Saber o que se quer além de “ganhar dinheiro e ser bem-sucedido” não é tarefa fácil e esbarra na construção da maturidade.

Em nenhum momento quero colocar aqui a empresa como vilã e o jovem como o mocinho. De forma alguma. A empresa também precisa de pessoas engajadas e com vontade de aprender. Apenas que a relação inicial tem um corpo mais opulento para um dos lados da balança e o outro continua iniciando o processo de musculatura e conhecimento.

E quais são os cuidados que a empresa precisa ter? Que olhar a curto, médio e longo prazo são necessários?

A meu ver, cabe as empresas terem programas que absorvam esse profissional que está dando seus primeiros passos, subindo os primeiros degraus. Dar a ele uma experiência que possa levar de forma positiva para a sua vida e querer continuar essa construção. Trazer experiências traumáticas e rasas podem transformar uma joia em um vidro quebrado.

O jovem precisa ser lapidado e trabalhado com cuidado, cirurgicamente. Com certeza em há uma linha tênue entre aprendizado/engajamento e o tempo. Uns irão mais rápido e com mais vontade e outros, precisaram de um pequeno empurrão, que não pode vir a se tornar um hábito.

Muitos jovens têm seu primeiro emprego por estágios e muitas empresas acabam usando essa força de trabalho de forma equivocada. Ele está lá para aprender e não para fazer trabalhos que ninguém gosta.

Palavras essenciais
Num passado recente, estagiário era sinônimo de ajudante de arquivamento de documentos. Isso não cabe mais em nenhuma organização. Independente se a vaga é de estágio ou não, as empresas precisam pensar em programas de desenvolvimento desses jovens. Imaginem que muitos deles serão os futuros CEOs, CIOs, CTOs e outros cargos dispostos nas companhias.

Saber identificar e preparar esse sangue novo requer um olhar mais delicado e atento pela gerência imediata e o RH. Saber extrair o melhor que ele pode trazer de imediato e a médio e longo prazo. Intensificar as suas habilidades naturais e trabalhar no que é necessário para compor o seu cargo inicial são primordiais. Nenhum profissional nasce pronto. É preciso muita transpiração e orientação.

Palavras essenciais que precisam acompanhar esse início de carreira: preparação, conhecimento, estudo, desenvolvimento, valores, descobertas, respeito, cuidado e direcionamento.

E se você receber um jovem para trabalhar no seu setor sob a sua direção ou não, saiba ser generoso e pense em sua primeira experiência de trabalho. Trate ele como você gostaria de ter sido tratado!

 

 

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Patrícia Milaré Bertão é casada e mãe de duas filhas. Formada em Secretária Executiva (USC), Administração de Empresa (UNIFAE) e MBA em Gestão Empresarial (FAE). É coordenadora sênior Account, TIM Brasil. Participa de um blog que trata sobre diversos temas e assuntos como Comportamento, Relacionamentos e Mundo Corporativo (@vem_que_a_gente_explica). Voluntária na Social Startup, sem fins lucrativos, com foco no desenvolvimento humano – Da Periferia para a Faria Lima. Tem um viés poético e tem três poesias classificadas e publicadas em livros, Poetize 2022 Seleção Poesia Brasileira, Poesia Livre 2022 e Poesia BR. Escrever é meu divã! Colunista EA “Mundo Organizacional”.

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