Por Luciel Henrique de Oliveira

 

O Green New Deal refere-se a um conjunto abrangente de propostas políticas voltadas para combater as mudanças climáticas e promover justiça social. Ele surgiu inicialmente nos Estados Unidos, inspirado pelo “New Deal” da década de 1930, mas adaptado aos desafios ambientais contemporâneos. O termo ganhou destaque principalmente com a resolução apresentada em 2019 pelo Congresso dos EUA, liderada por políticos progressistas como Alexandria Ocasio-Cortez e Ed Markey.

O Acordo de Paris é um tratado internacional firmado em 2015 para limitar o aquecimento global a menos de 2°C acima dos níveis pré-industriais, com esforços para mantê-lo em 1,5°C, por meio de metas nacionais de redução de emissões de gases de efeito estufa.

Ele estabelece que cada país defina metas próprias de redução de emissões, revisadas periodicamente, além de promover a neutralidade de carbono até a segunda metade deste século.

O acordo incentiva o financiamento climático por nações desenvolvidas para apoiar países em desenvolvimento, enfatiza a transparência no monitoramento das metas e promove a adaptação e resiliência climática, buscando uma resposta global coordenada aos desafios das mudanças climáticas.

A recente decisão do governo dos Estados Unidos de abandonar políticas voltadas para a economia verde, sob a liderança do presidente Donald Trump, coloca o Brasil em uma posição estratégica. O recuo em ações como o Green New Deal, a saída do Acordo de Paris e a retirada de incentivos para veículos elétricos geram preocupações globais, e criam uma oportunidade única para o Brasil se consolidar como líder mundial na transição energética, ampliando sua relevância nos fatores ESG (Ambiental, Social e Governança).

Avanços estruturais e potencial brasileiro

O Brasil possui um portfólio robusto para atrair investimentos em energias limpas. Marcos legais como a Lei do Combustível do Futuro, a regulamentação de Eólicas Offshore e a legislação sobre Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono demonstram comprometimento com a transição energética.

Esses avanços garantem segurança jurídica e regulatória para investidores, um diferencial essencial em um cenário global de incertezas.

Por exemplo, a Lei do Combustível do Futuro (Lei nº 14.993, 08/10/2024) fomenta a descarbonização e promove a mobilidade sustentável, incentivando o uso de biodiesel, etanol e combustíveis sustentáveis de aviação (SAF). Empresas como Raízen e Petrobras já têm iniciativas robustas nesse campo, ampliando a produção de biocombustíveis e investindo em tecnologia.

Setores em expansão e recursos minerais

O Brasil também se destaca por suas reservas expressivas de minerais críticos como níquel, grafita, terras raras e lítio, fundamentais para a produção de baterias e componentes de tecnologias verdes.

Atualmente, mais de 50 projetos relacionados a minerais para a transição energética estão em andamento.

Empresas como Vale e Sigma Lithium lideram projetos voltados para a extração e processamento sustentável desses recursos, posicionando o Brasil como um fornecedor global de materiais críticos para a economia verde. A Sigma Lithium é uma empresa de origem canadense. Apesar de sua sede estar no Canadá, a empresa concentra suas operações no Brasil, onde desenvolve projetos de extração de lítio sustentável, principalmente no estado de Minas Gerais.

Seu foco é atender à crescente demanda global por baterias de veículos elétricos e tecnologias de energia limpa, adotando práticas ambientalmente responsáveis no processo de extração e beneficiamento.

Também outras empresas, destacam-se por sua contribuição para a economia verde e a transição energética.

Pode-se citar a CBMM (Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração), líder mundial na produção de nióbio utilizado em ligas metálicas para turbinas e componentes de energia eólica, a canadense Lithium Ionic, que desenvolve projetos de extração de lítio em Minas Gerais para abastecer o mercado global de baterias de veículos elétricos, a inglesa Anglo American, produtora de níquel e outros minerais essenciais para tecnologias verdes com forte compromisso com sustentabilidade, e a brasileira Mineração Taboca, especializada na produção de estanho e terras raras utilizados em dispositivos eletrônicos e tecnologias limpas.

Integração dos fatores ESG nas oportunidades brasileiras

A integração de fatores ESG é fundamental para atrair investimentos e garantir a sustentabilidade das iniciativas. O Brasil possui grandes chances de se destacar nos três pilares:

  • Ambiental: Expansão de projetos de energias renováveis, como solar, eólica e biocombustíveis, para mitigar mudanças climáticas.
  • Social: Criação de empregos em regiões menos desenvolvidas e fortalecimento da agricultura familiar como parte da cadeia de biocombustíveis.
  • Governança: Estabelecimento de marcos regulatórios robustos que garantam transparência e atração de capital estrangeiro.

Oportunidades para empresas e investidores

O abandono da economia verde pelos EUA representa uma chance única para o Brasil atrair multinacionais e fundos de investimento comprometidos com a sustentabilidade. A crescente demanda por data centers que operem com energia limpa também se apresenta como uma oportunidade significativa. Empresas como Google e Microsoft já investem em energia renovável no Brasil para sustentar suas operações. Iniciativas alinhadas aos fatores ESG aumentam o valor percebido das empresas e consolidam sua posição no mercado global.

Reflexões e ações para o futuro

  1. Descarbonização da Matriz Energética: Aumentar os percentuais de mistura de biocombustíveis no transporte terrestre e avançar no uso do biometano e do SAF.
  2. Inovação Tecnológica: Investir em P&D para aprimorar processos de geração e armazenamento de energia limpa.
  3. Educação e Capacitação: Preparar profissionais para os desafios da transição energética, fortalecendo programas de ensino e treinamento.
  4. Expansão Internacional: Aproveitar a liderança na transição energética para atrair investidores estrangeiros, especialmente em parcerias público-privadas.

Desdobramentos para outros setores

A transição energética não é exclusiva do setor de energia. Outros segmentos também podem se beneficiar:

  • Agronegócio: O uso de biocombustíveis pode reduzir custos e emissões na logística e produção.
  • Construção civil: Investimentos em energia solar e soluções eólicas para edifícios sustentáveis estão em crescimento.
  • Indústria automotiva: A adoção de carros elétricos e híbridos impulsiona a demanda por componentes sustentáveis.
  • Indústria química: A transição energética promove a substituição de insumos derivados de petróleo por alternativas renováveis, como o etanol, na fabricação de produtos químicos, plásticos e biopolímeros.
  • Saúde: Hospitais e clínicas estão adotando fontes renováveis, como painéis solares, para reduzir custos operacionais e emissões, além de integrar tecnologias sustentáveis em equipamentos médicos e sistemas de climatização.
  • Tecnologia e Telecomunicações: A demanda por data centers que utilizem energia limpa cresce rapidamente, incentivando investimentos em infraestrutura sustentável e eficiência energética para suportar serviços como computação em nuvem e inteligência artificial.

Considerações finais

A responsabilidade do Brasil na liderança da transição energética global é um desafio e uma oportunidade. Com políticas estruturadas, recursos abundantes e iniciativas inovadoras, o país pode se posicionar como modelo de desenvolvimento sustentável.

Administradores, empreendedores e gestores têm a chance de transformar esse cenário em vantagens competitivas para suas organizações, promovendo um futuro mais verde e próspero para todos, com um foco estratégico nos fatores ESG.

Para saber mais:

  • COLE, Megan J. ESG risks to global platinum supply: A case study of Mogalakwena Mine, South Africa. Resources Policy, v. 85, p. 104054, 2023.
  • RENALDI, Vikky. Sustainable Energy Transition: Circular Economy and Sustainable Financing for Environmental, Social and Governance (ESG) Practices: by Vinay Kandpal, Anshuman Jaswal, Ernesto DR Santibanez Gonzalez and Naveen Agarwal, Switzerland, Springer, 2024, 324 pp.
  • SILVEIRA, Alexandre. Como o Brasil deve encarar o abandono da economia verde por Donald Trump: mudança de rumo amplia a responsabilidade do país em seu papel de liderança mundial na transição energética. Folha de São Paulo, São Paulo, 25 jan. 2025. Opinião, p. A4.
  • UNGARETTI, Carlos Renato; MENDONÇA, Marco Aurélio Alves de; NUNES, Ticiana Gabrielle Amaral. A China pode afetar a transição energética na América Latina? Uma análise a partir do índice de transição energética do Fórum Econômico Mundial. 2025.

 

Luciel H de Oliveira 1 - O Brasil na liderança da transição energética

Luciel Henrique de Oliveira é engenheiro Agrônomo e doutor em Administração (FGV), pós-doutorado em Inovação, dedicado à academia como professor e pesquisador desde 1990 (FACAMP; UNIFAE; PUC-MG). Com vasta experiência em Gestão de Operações e Logística, destacam-se seus estudos e pesquisas em temas como Inovação & IA, Agronegócios, Gestão de Serviços, Sustentabilidade/ESG, Economia Circular e Responsabilidade Social Empresarial. Comprometido com o impacto social, acredita no poder transformador da educação, na importância da colaboração em rede e no empreendedorismo para gerar mudanças positivas na sociedade mediante soluções inovadoras. Colunista EA “ESG & Vida Sustentável”.

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