Por Alexandre Del Rey
Alinhar pessoas em torno de objetivos e metas compartilhadas já era um desafio considerável. Agora, adicionamos um componente inédito: Algoritmos que influenciam tanto as operações quanto as decisões mais estratégicas. O que antes se resolvia com reuniões de diretoria e programas de Cultura Interna precisa, hoje, levar em conta uma lógica digital inserida em cada camada do negócio.
Abaixo, exploramos como esse cenário redefine o alinhamento e exige uma nova postura de líderes, gestores e profissionais de tecnologia.
O desafio do alinhamento em duas dimensões
Por muito tempo, alinhar uma Organização significava equilibrar interesses pessoais, metas de equipe e a visão maior da empresa. A chegada da IA adiciona uma “segunda dimensão”: aquela pautada pelos dados e parâmetros que treinam modelos de Inteligência Artificial. Não basta mais unificar a equipe em torno de um propósito; é preciso garantir que os algoritmos também reflitam esse mesmo conjunto de valores e prioridades.
Quando a empresa quer explorar um novo mercado, mas o algoritmo de análise de oportunidades enxerga apenas o histórico de rentabilidade imediata, surge um atrito entre o plano de expansão e as recomendações automáticas que priorizam lucro de curto prazo.
A chave está em calibrar essas duas lógicas, para que uma não invalide a outra.
A agenda oculta dos modelos de Inteligência Artificial
Cada algoritmo carrega consigo uma certa “agenda”, definida pelos dados e instruções que foram usados para criá-lo. Muitas vezes, essa agenda fica invisível no dia a dia, mas se revela nos resultados — ou nas distorções — que o modelo acaba gerando. Um sistema de recrutamento que favorece candidatos de determinadas regiões ou formações, por exemplo, pode colidir frontalmente com a política de diversidade da empresa.
O grande problema não está na malícia do algoritmo, mas nas lacunas de quem o projetou.
Se a empresa não explicita suas diretrizes culturais e não supervisiona como essas regras viram “código”, o alinhamento rapidamente se perde. Afinal, o modelo seguirá fielmente a lógica que lhe foi passada, mesmo que ela não esteja em sintonia com os princípios institucionais.
Quando a Inteligência Artificial assume o volante das decisões
À medida que a organização ganha complexidade, passa a delegar mais tarefas — e até decisões — aos algoritmos. Antes, os gestores usavam planilhas e relatórios para pensar estratégias; agora, é comum que um modelo de machine learning aponte o melhor caminho. Em muitos casos, essas recomendações são tão confiáveis e ágeis que a tomada de decisão se torna quase automática. O dilema aparece quando o algoritmo não considera variáveis de longo prazo ou aspectos que fogem à estatística fria, mas são fundamentais para a competitividade ou reputação da empresa.
Na pressa de seguir a “inteligência” dos dados, corre-se o risco de trair o próprio DNA do negócio, sacrificando projetos de inovação, parcerias de valor estratégico ou mesmo a relação de confiança com clientes e colaboradores.
Por que uma visão clara vale mais do que mil linhas de código
Não existe tecnologia capaz de compensar a falta de uma visão bem definida. Se a liderança não enxerga com clareza aonde a empresa quer chegar, dificilmente conseguirá criar parâmetros sólidos para orientar seus sistemas. Como resultado, o algoritmo pode simplesmente reforçar vícios de curto prazo ou tomar decisões fragmentadas.
Visão clara significa não apenas ter metas numéricas, mas compreender e comunicar valores essenciais, limites éticos e prioridades de longo prazo.
Essa clareza serve como bússola para o comportamento humano e, simultaneamente, funciona como linha mestra para o desenvolvimento e a manutenção dos modelos de IA. Quando bem-feita, a integração dessas dimensões gera um círculo virtuoso em que o algoritmo potencializa as estratégias, em vez de seguir numa rota paralela ou contraditória.
Ajustes contínuos em cenários de incerteza
Mercados mudam de forma veloz: o que ontem era tendência, hoje pode se mostrar obsoleto. Da mesma forma, os algoritmos precisam ser reavaliados e retreinados regularmente para refletir novas condições, sejam elas de ordem econômica, legal ou cultural. Companhias que permanecem presas a modelos antigos acabam recebendo recomendações desalinhadas ou ignorando oportunidades emergentes.
Nesse sentido, ter equipes multidisciplinares — com profissionais de negócio e tecnologia dialogando a todo instante — faz toda a diferença. São elas que conseguem ajustar o “código” sem perder a coerência estratégica, avaliando o impacto de cada atualização nos processos e no direcionamento maior da empresa.
Ensaiando a sinfonia: para onde vamos?
A soma entre o talento humano e a precisão algorítmica tem potencial para impulsionar negócios a patamares inexplorados. Mas chegar lá exige reconhecer que nenhuma das partes — pessoas ou IA — funciona de maneira isolada. O alinhamento de agendas, objetivos e culturas deve agora se estender também à lógica invisível dos sistemas.
O papel da liderança é gerenciar essa orquestração, garantindo que os algoritmos não sejam apenas ferramentas produtivas, mas elementos ativos de uma mesma visão de futuro.
Quando todos tocam na mesma escala, a sinfonia corporativa ganha harmonia e impacto, tornando a organização mais forte, resiliente e preparada para responder às mudanças contínuas do nosso tempo.
Alexandre Del Rey é fundador da I2AI – International Association of Artificial Intelligence, conselheiro da Rede de Inovação de IA e do Movimento Brasil Digital e da Lusofonia Digital. Sócio-fundador da Egronn, startup de geração de energia distribuída e da Engrama – Consultoria de Inovação e Estratégia. Sócio e consultor sênior da Advance Consulting, consultoria de Vendas, Marketing e Estratégia para empresas de tecnologia. É professor, pesquisador, palestrante e autor nos temas de Tecnologia, Inovação, Empreendedorismo, Estratégia, Inteligência Competitiva, Influência e Economia Comportamental. Investidor anjo. Colunista EA “Futuros Artificiais”.
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