Por José Gonçales Junior
Fim de ano sempre foi e será momento oportuno de fazermos uma revisão de tudo o que se passou, mas esse ano em especial gostaria de ser menos nostálgico e mais assertivo naquilo que devemos mudar, para que não continuemos a permitir que os mesmos erros, catástrofes e falhas ocorram, quase que em “closed looping”.
Lembro que muitos desses erros estão arraigados em nosso modelo mental humano, que veio evoluindo desde a pré-história e que permanecem ainda fortes e manifestos, a exemplo da forte presença do “macho-alfa” comandando enormes conglomerados e corporações com seu “braço de ferro” e sua diretoria obediente e servil.
Para não me perder em centenas de fatos de diversas matizes e assuntos resolvi dividir minha análise em três grandes frentes nas quais acredito que os fatos se desdobraram:
A primeira tratarei sobre os perigosos retrocessos e possíveis avanços na sustentabilidade/ESG.
A segunda está ligada ao que chamo de retorno ao eterno passado, levando perigosamente o mundo a retrocessos na política, na democracia, nos direitos humanos e na sociedade como um todo.
Por fim, no tema três, refletirei sobre o trinômio trabalho, consumo e convívio, que continua desequilibrado para a grande maioria dos brasileiros. Nesse quesito resgato a notícia de que o Brasil este ano ficou em 2º lugar no mundo em burnout no trabalho, atrás somente do Japão.
Tratemos aqui do primeiro tema, coincidentemente com um dos anos mais quentes da história com recordes de temperatura por todo o país e pelo mundo.
O ano terminou e uma das grandes perguntas que permanecem no meio das comunidades ligadas à temática da sustentabilidade é se o inveterado “greenwashing” acabou ganhando mais força em 2023. Houve recorde de incidentes envolvendo fatos ambientais e problemas ligados à deterioração das condições de trabalho.
Paralelo a isso, o ano terminou de forma positiva para o ESG com a publicação da Resolução 193 da Comissão de Valores Mobiliários do Governo Federal.
Essa resolução exige que as empresas que pleiteiam fundos, financiamentos e parcerias com o governo passem a publicar relatórios de ESG mais consistentes e com base internacional fundamentada nos trabalhos do International Sustainability Standards Board (ISSB), baseado no International Financial Reporting Standart Fundation (IFRS Foundation), que é um dos mais importantes órgãos emissores de regulação para padrões de reporting em ESG.
Isso demonstra uma guinada governamental potencial para se assumir o comando e ser um órgão regulador da área no Brasil, fortalecendo as ações de ESG e reporting das empresas mais sérias e dificultando as práticas de greenwashing costumeiras nesse país.
Outro ponto positivo foram os resultados apresentados pela COP 28, realizada num dos centros geográficos da indústria petrolífera, os Emirados Árabes Unidos. Pela primeira vez nas COP´s, o documento final cita a necessidade de transição energética do petróleo para fontes renováveis, apesar do forte cerceamento dos magnatas da indústria do petróleo mundial.
Mas o que preocupa e o que sinaliza de forma clara para esse ano que começa é que SUSTENTABILIDADE, não é mais tema para debates acalorados entre “ambientalistas” e o povo da “economia marrom”, se isso altera o PIB, a renda per capita ou o ROI (Retorno do Investimento), mas é uma premissa e o mais alto objetivo a ser alcançado pela humanidade.
Esta temática trata de uma BANDEIRA de vida, de missão pelo futuro do planeta, da humanidade e de nossos filhos, netos e bisnetos.
Portanto, quando os ecossistemas demonstram sintomas claros de desequilíbrio, a exemplo do clima, ou das correntes oceânicas, e tais sintomas indicam riscos muito nítidos a respeito de uma possível “sexta extinção” futura ou uma catástrofe ambiental sem igual, isso mexe com nosso vínculo com esse planeta e com a Vida nela.
Da mesma forma que homens e mulheres apaixonados por invenções e pelo crescimento da indústria, doaram suas vidas para levar a humanidade a níveis de conforto e sofisticação jamais imaginados no século XIX, hoje a humanidade carece de novos homens e mulheres apaixonados pela preservação da biodiversidade e da vida para o futuro de todos nós.
Se sabemos que a paixão e seus interesses movem o sistema, a economia, a hora é dessa paixão olhar para o bem maior, que está acima de todo bem, toda posse e toda riqueza material.
A paixão moveu economistas e administradores a construírem indicadores como o ROI; que a paixão pela vida no futuro e pela qualidade de vida de nossos netos levem a todos o RFL (Return on Future Life).
Assim o sistema produtivo e a economia poderão se libertar do velho paradigma: vamos produzir agora para ver o quanto acumulamos no final do ciclo, e desenvolva o modelo que planeja o que fazer agora para que os “créditos” em Vida sejam colhidos daqui 10, 20, 30 e 50 anos.
Olhar para trás e vangloriar-se das conquistas é uma atitude humana que vem da pré-história. Busquemos cada um de nós olharmos para os reflexos futuros do que podemos fazer agora, pois olhar o futuro é digno de nossas mais elevadas aspirações.
Lembremos que a Vida se sobressai sobre o PIB, eternamente.
José Gonçales Junior é geógrafo pela USP, MBA em Sustentabilidade (EAESP-FGV), pós-graduado em Neurociência Comportamental (PUC-RS), consultor em ESG e Bem-estar no mercado corporativo. Lecionou 15 anos em cursos de pós-graduação (SENAC, INPG, Faculdades Metropolitanas de Campinas, Ibmec Campinas), palestrante, mentor de mudança de carreira e implantação de parâmetros de bem-estar, estudioso apaixonado pelos temas Neurociência, Mudanças de Comportamento e Futuro do Trabalho. Mora com a família em um silencioso sítio em Vargem Grande Paulista, interior de São Paulo, onde dedica-se a família, a mentorias, consultorias, pesquisas e a escrever. É colunista EA “Carreira e Bem-estar”.
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